Um pedido de vista formulado pela ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha interrompeu, na sessão desta quarta-feira (25), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE 614406) que trata de um tema com repercussão geral reconhecida, em razão de ter motivado o ajuizamento de numerosas ações judiciais no País: a cobrança de Imposto de Renda (IR) sobre rendimentos pagos de forma acumulada a pessoas físicas que venceram, na Justiça, demandas trabalhistas ou previdenciárias.
No caso em questão, trata-se de uma dívida de natureza previdenciária paga pelo INSS após o reconhecimento do direito pela Justiça Federal. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) considerou inconstitucional o artigo 12 da Lei nº 7.713/1988, pelo qual os rendimentos pagos acumuladamente sujeitam-se ao regime de caixa (no qual a cobrança é feita de uma só vez) e não ao regime de competência (cobrança diluída em 12 meses), e assegurou ao trabalhador a incidência do IR conforme a tabela progressiva vigente no período mensal em que apurado o rendimento a menor (regime de competência). Segundo o TRF-4, a sistemática de tributação por regime de caixa viola os princípios da isonomia e da capacidade contributiva.
Argumento da União
No recurso ao STF, a União sustentou não haver qualquer inconstitucionalidade na cobrança, já que o Imposto de Renda é cobrado quando da aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda. Além disso, a União sustentou que não poderia ser responsabilizada pelo atraso nos pagamentos de verbas trabalhistas e que, no caso em questão, o trabalhador recebeu acréscimos patrimoniais que justificam a incidência da alíquota majorada do IR (27,5).
Em seu voto, a relatora do recurso, ministra Ellen Gracie, acolheu os argumentos da União. Segundo ela, não houve violação aos princípios da isonomia ou da capacidade contributiva como entendeu o TRF-4. "Não há, na lei, qualquer distinção de tratamento entre contribuintes. O que ocorre é o inverso: alguns contribuintes é que pretendem tratamento diferenciado por se considerarem injustamente onerados em razão da tributação sobre valores elevados, percebidos de uma só vez. Se a sistemática de tributação das pessoas físicas é pautada pelo regime de caixa, é a disponibilidade econômica dos rendimentos que deve servir de critério comparativo para a respectiva análise", afirmou.
A ministra lembrou que esta sistemática de tributação já foi alterada pelo governo federal, por meio da Medida Provisória 497, convertida na Lei nº 12.350, de 30 de dezembro de 2010, e alcança os rendimentos acumulados recebidos a partir de 2010. "O novo dispositivo legal determinou que, por ocasião do pagamento acumulado de rendimentos do trabalho ou de aposentadorias e pensões correspondentes a anos-calendário anteriores ao do recebimento, a tributação seja exclusiva na fonte, no mês do recebimento do crédito, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês", explicou a relatora. Ellen Gracie acrescentou que, como o recurso extraordinário refere-se à regra anterior à alteração legislativa, não se pode falar em inconstitucionalidade do artigo 12 da Lei nº 7.713/1988.
Divergência
O ministro Marco Aurélio abriu a divergência. Segundo ele, não é admissível que o sistema possa "apenar o contribuinte duas vezes" e a União foi sensível a isso. Para o ministro, embora a Lei nº 12.350/2010 não faça alusão expressa ao regime de competência, implicou a adoção dessa sistemática mediante a inserção de cálculos por épocas próprias. "O contribuinte não recebe as parcelas na época devida. É compelido a ingressar em juízo para ver declarado seu direito. E, para efeito de incidência de Imposto de Renda, há a junção dessas parcelas. O Imposto de Renda não tem como fato gerador a disponibilidade financeira, que diz respeito à posse. O Imposto de Renda tem como fato gerador a disponibilidade econômica e jurídica. Se assim o é, se esse é o fato gerador do Imposto de Renda, não se pode deixar de considerar o fenômeno verificado nas épocas próprias quanto a esta disponibilidade", afirmou.
O ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência aberta pelo ministro Marco Aurélio e deu um depoimento em relação à matéria, a qual contesta desde quando atuou como advogado-geral da União. "Eu não me conformava com essa injustiça, com esse verdadeiro enriquecimento sem causa por parte do Estado, que afronta sim o princípio da isonomia", salientou. O ministro citou um exemplo a partir de dados da própria Receita Federal. Segundo ele, pela sistemática antiga, sobre um rendimento acumulado de R$ 20 mil, com incidência da alíquota de 27,5, o Imposto de Renda a ser pago é de R$ 4.807,22. Com a nova sistemática, a alíquota incidente sobre os mesmos R$ 20 mil é de 7,5, o que reduz o IR para R$ 375,64.
Fonte: STF
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