Seja muito bem-vindo ao Blog da Delegacia Sindical de Belém (PA)

Seja muito bem-vindo ao Blog da Delegacia Sindical do Sindireceita em Belém - No ar desde 31/01/2011 - Agora também no twitter: http://twitter.com/talessqueiroz.

quarta-feira, 9 de março de 2011

A Ideologia Meritocrática e a Receita Federal

Sempre que se fala em “meritocracia” é comum vir à mente temas como as discussões sobre desempenho funcional e sua avaliação, justiça social, reforma administrativa, neoliberalismo, competência, produtividade e etc. Contudo o princípio da meritocracia é muito mais amplo que esses temas recorrentes, é uma das mais importantes ideologias também no âmbito da Administração Pública, pois é o principal critério de hierarquização social da sociedade hodierna.
          A Prof. Dra. Lívia Barbosa ensina que a “meritocracia é um conjunto de valores que postula que as posições dos indivíduos na sociedade devem ser conseqüência do mérito de cada um”, isto é, há que haver um reconhecimento público das qualidades das realizações individuais. Ainda em outras palavras, os cargos de dirigentes em determinado órgão público, por exemplo, deveriam ser conquistados por aqueles que demonstrem publicamente que seus valores (educação, comprometimento, moral, aptidão específica, preparo e etc.) ou simplesmente conjunto de talentos, habilidades e esforço sejam em determinado momento superiores a de outros concorrentes.
         A Portaria RFB nº 453, de 29 de janeiro de 2009, que dispõe sobre o processo seletivo interno para os cargos de Delegado e Inspetor-Chefe na RFB, e os reserva exclusivamente a um único cargo da Carreira ARFB, é um dos maiores exemplos do corporativismo negativo existente dentro da casa, uma tentativa exasperada de manutenção do “status quo” da “aristocracia” interna corporis, e arquétipo da completa desconsideração do princípio da meritocracia no Serviço Público. Não se trata tão somente de um absurdo jurídico, mas também de incoerência administrativa. É uma tentativa “disfarçada” de reserva de mercado para os cargos de Delegados e Inspetores exclusivamente a um único cargo.
          Qualquer servidor, independentemente do cargo que ocupe, pode reunir condições para bem exercer uma função de responsabilidade e complexidade dentro da atual estrutura administrativa da RFB, seja ela qual for, desde que tenha perfil, experiência, preparo, ética e comprometimento com a coisa pública. Não creio que um simples concurso público para um cargo, seja ele de maior ou de menor complexidade, sem qualquer relação com a ciência da administração, possa ser critério único capaz de diferenciar e identificar um administrador. Planejar, organizar, controlar, coordenar e comandar não deveriam ser tarefas exclusivas do cargo “A” ou “B”, mas de quem reconhecidamente tem méritos para tanto. A idéia do processo seletivo interno não é ruim, mas perde seu sentido quando a delimitam tão somente a um único cargo.
          É comum nas empresas privadas histórias de funcionários que tiveram como primeira função um cargo de menor estatura hierárquica, mas que, através de seus méritos e competências, aproveitando oportunidades, conseguiram galgar cargos bastante elevados, não raras vezes até o mais alto cargo da instituição. Em tese, um ATRFB pode ser Secretário da Receita Federal do Brasil ou mesmo Ministro da Fazenda (cargos políticos), chefiando desse modo todo o “alto escalão” da RFB, mas não pode ser delegado da RFB em Marabá, por exemplo, o que nos parece mais uma incoerência. Não há qualquer impedimento legal que um ATRFB chefie um AFRFB, pois não há hierarquia entre os dois cargos públicos, não há subordinação, aliás, a Justiça já se manifestou a esse respeito na ação nº 2000.61.00.049389-3, que tramitou perante o r. juízo da 1ª Vara Cível Federal da Seção Judiciária de São Paulo.
           É bem verdade que no Mandado de Segurança nº 2009.34.00.004220- 3, impetrado pelo Sindireceita, e que objetivava a declaração de ilegalidade dos artigos 1º e 7º da Portaria RFB nº 453/2009 em decisão superficial a Justiça denegou a segurança, tomando por base, quase que na íntegra, o parecer do Ministério Público Federal, que alega que há “diferença substancial entre os dois os dois cargos”. Há um equívoco na conclusão do MPF, pois, equivocada está a premissa. Um ATRFB que esteja investido no cargo de delegado ou inspetor da RFB não necessariamente necessita realizar atribuições privativas de AFRFB. Logo, ao nosso sentir, a “diferença substancial” (que só pode se resumir às atribuições privativas), não deveria ser supedâneo para a denegação da segurança.
          Essa questão precisa voltar a ser discutida por outros meios judiciais até porque cremos que há um vício de competência a ferir de morte a Portaria RFB nº 453/2009, pois o embasamento jurídico (art. 34 do Anexo I do Decreto nº 6.661/2008 – atualmente revogado - e o inciso X do art. 224 do Regimento Interno) mencionado para a confecção do referido ato não autoriza o Secretário da Receita Federal do Brasil a “legislar” sobre pessoal, reservando cargos em comissão da administração pública federal, em especial da RFB, a determinado cargo da Carreira ARFB. O Regimento Interno da RFB autoriza o Secretário a, no máximo, aplicar a legislação de pessoal aos servidores, inclusive no interesse da ética e da disciplina. Tal matéria deveria ser tratada por Decreto do Chefe do Poder Executivo.
         Temos plena consciência da resistência cultural existente dentro da casa na implementação da ideologia da meritocracia, que privilegia o mais capaz, o mais apto, o mais preparado para enfrentar os problemas inerentes à administração pública e aos específicos inerentes à RFB. Ora, qual o receio de se concorrer em um processo seletivo igualitário e transparente, a um cargo em comissão dentro da RFB? Que vença o melhor! 

Nenhum comentário:

Postar um comentário